Quando a gente terminou eu botei cortinas novas nas janelas e prometi a mim mesma nunca mais abri-las já que o meu apartamento, que era de fundos, dava de frente para a sua casa. Mas não foi suficiente para bater a força da natureza humana. Essa sede mesquinha de saber, de analisar e esmiuçar à procura daquele segundo onde tudo mudou.
A cada coisa que você fazia eu me torturava mais um pouquinho, eu torcia de leve o punhal sobre a carne. Eu espiava sua vida com devoção e regularidade mas sempre de longe, sorrateiramente. Fiquei alguns meses assim, bisbilhotando, vivenciando em silêncio cada passo seu através das cortinas novas que eu tinha jurado fechar para sempre.
Vi você se formar, vi seus dias ruins, vi você feliz. Secretamente eu rezava para que um dia você parasse em frente à minha janela e lembrasse que eu estava lá, pacientemente, à espera. Mais do que querer, eu acreditava que isso aconteceria.
Até que um dia, aconteceu. Parece coisa de cinema. Você ficou ali, em frente à minha janela e abriu os braços. Foi aí que meu coração, tão cansado dos meses de sofrimento calado, parou de vez. Ela caminhou na sua direção e encaixou perfeitamente no seu abraço, de um jeito que só eu achava que cabia.
Taquei fogo nas cortinas e coloquei o apartamento de fundos à venda. Hoje eu moro de frente para o mar e a única coisa que eu vejo quando olho da minha janela é o infinito.
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