Como todo mundo, ela queria uma vida memorável e resolveu criá-la.
Então ela decidiu que aquele seria o primeiro capítulo da sua vida. Uau, estava escrevendo uma auto-biografia contínua. Quem é que não se sente importante desse jeito? Encarou o passado como um prefácio. Fez agradecimentos e decidiu que a história iria começar.
Mas, como em todo bom livro, a sua história tinha que ter um início em grande. Alguma coisa que marque o tom da narrativa. No primeiro dia acordou com o cachorro em cima da cama. Espreguiçou-se e decidiu que aquele começo não seria bom. "Vou tentar novamente amanhã".
Só que o dia seguinte era uma terça-feira. Nada se começa numa terça-feira, não é? "Vamos então adiar para a semana que vem". E nessa semana nem notou o nascimento do sobrinho. Não falou do abraço que deu na irmã, nas gargalhadas por causa de um tropeção na calçada. E, que tropeção! Troceu o tornozelo e teve que ficar uma semana de muletas.
É claro que a sua história não podia começar apenas com um pé, certo? E adiou novamente o primeiro capítulo.
E foi adiando. Uma vez era porque estava chovendo, outro dia foi porque quebrou o salto do sapato e ainda teve aquela vez que decidiu que não podia começar a biografia porque apanhou todos os semáforos vermelhos no caminho para o trabalho.
Só que, à medida que ia adiando a sua história, adiava também a sua vida. Não adotou aquele dálmata que estava sozinho na rua, não foi jantar com as amigas porque não era o dia certo, não fez nada extraordinário, nada memorável. Tudo o que fez foi esperar o dia certo.
Esse dia veio em meados de setembro, junto com a primavera. Um sol lindo e ela acordou com um cabelo esplendoroso. Até tinha emagrecido um quilo e meio nessa semana. Enquanto caminhava pela rua ia pensando nas primeiras palavras do seu livro.
Foi aí que aconteceu. Foi tudo tão rápido que ela nem conseguiria descrever. E só se lembrava da dor excruciante, do sangue, da perna num ângulo estranho e dos estranhos se acumulando à volta dela. Do som da ambulância ao longe e do moço chorando deseperado perto do carro, se perguntando: "Meu Deus, o que eu fiz?".
Desmaiou. Antes de abrir os olhos, ouviu os sussurros do médico, os bips dos aparelho e ainda sentia dor.
Viu que a sua vida já não dava para um livro. Foi quando, no hospital, pouco antes de perder a consciência, encontrou uma menina, para quem ditou esse conto aqui.
Suspirou.
E foi o fim.
11 comentários:
Final inesperado, mesmo assim gostei do texto! =)
Abraço!
Tudo aconteceu tão rápido na vida da personagem (rs). Ía ser legal se eu achasse um dálmata na rua, mas só vejo vira latas...
Abraço.
ai... e ainda bem que ela encontrou a menina pra ditar esse conto aqui!
Beijo
Nao entendi exatamente o que ocorreu no final.Ela matou alguem ??
Olá Ana.
Que ótimos texto este. Gostei bastante. Um final diferente, bem incomum.
Obrigada pela visita!
Abraços.
Berenice
A idéia é boa, assim como a realização metalingüística.
Gostei.
Mas acho que não havia necessidade das frases finais. Mas o texto é seu e vc o termina como quiser.
Foi somente uma sugestão de quem curtiu mo miniconto.
A preopísito: não está faltando nada em "Mas, como todo bom livro, a sua história tinha que ter um início em grande."?
Abraços
Muito bom seu blog, parabéns pelo conteudo e pelo topo do seu blog, muito criativo
RUBENS CORREIA
www.blogdorubinho.cjb.net
corrigido :)
Obrigada pela crítica!
Ana parabéns pelo blog, honesto, layout limpo, legivel e sem aquele monte de propaganda que o pessoal bota por ai! Curti a mix tape tb...bju
Linda.....
Sei bem como é essa sensação de "esperar" por algo pra começar a vida...
Acabo de sair de uma espera de 07 meses aproximadamente e só agora consegui perceber quanto tempo perdi...
Pelo menos não fui atropelado!
Ainda!!!!
Bjzzzzz
ó eu aqui de novo!
vim retribuir e agradecer tua visita ao meu blog tb!
Beijo, flor
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